CINQUENTÕES

(por: Mário Prata)

– Não, não se fazem mais velhos como antigamente.
– É verdade. Não se fazem.
– Veja você. Você está com 54.
Lembra quando você era jovem, 54 era um velhinho, não era?

– Avô, avô……
– Então. E as mulheres de 54?
– Bisavós, bisavós…..
– Não exagera. Avós, também. Aliás, mulher de 40 já tava velhinha.
Todas de preto. Iam à igreja. A mãe da gente tinha 40, né? Era uma
santa, né? Imagina se fazia o que as de 40 fazem hoje…

– Onde é que você quer chegar?
– É que a nossa geração mudou tudo. Mudou até a velhice.
A gente é de uma turma que rompeu com tudo. Esse negócio de Beatles,
Rolling Stone, pílula, tropicalismo, isso fez mudar tudo.

– Prossiga.
– É que a gente mudou os velhos que a gente ia ser. Veja a sua
roupa.
Você esta vestido igual a um cara de 20, 30 anos.
Você não está de terno e gravata como os cinquentões de antigamente.

– Você está é justificando a nossa velhice.
– Que velhice, cara! Você hoje faz tudo que um cara de 20 faz.
– Mais ou menos, mais ou menos.
– A nível comportamental…
– A nível, cara?
– Desculpa, mas comportalmente falando, ficou tudo igual.
O cara de hoje, com 50, não se comporta mais como
um cara de 50 dos anos 50. Nivelou, entendeu?

– Explica melhor.

– As meninas também. As nossas amigas de 40, por exemplo.
– Melhor não citar nomes.
– É que hoje elas fazem coisas que a gente não poderia imaginar
que a mãe da gente fizesse com a idade delas.
Estão todas aí, inteiraças. Liberadas, está entendendo?
Mandando ver. E nós também.
Fora que tem o Viagra que – dizem, dizem – vai segurar mais pra
frente.

– Você já usou?
– O que?
– Viagra.
– O que é isso cara? Ouvi falar, ouvi falar.
Mesmo porque não se conhece ninguém no mundo que assuma que já
tomou.
Parece que existe um acordo lá entre eles. Ninguém conta.
É de lei. Mas não desvia o assunto.
Eu não estou falando no desempenho sexual. Estou falando de cabeça.
Nivelou tudo. E, pra sorte nossa, nivelou por baixo.
Veja a roupa do seu filho. Igual à sua.
Antigamente um cara de 23 se vestia completamente
diferente de um cara de 53. Ou você alguma vez viu o seu pai de
tênis?
(nem pênis)
Acho que até para jogar tênis ele devia jogar de sapato.

– Se a gente então não está velho, vai ficar velho quando?
– Pois é aí que eu quero chegar. Não existe mais a velhice.
Nos anos 60 a gente fez tanta zorra que, sem querer,
garantimos o nosso futuro sem velhice. Pode escrever aí.
Não existe mais velhice.

– Ficamos imortais?
– Quase. Antigamente o sujeito começava a morrer mais cedo.
Ficava uns 10, 15 anos morrendo.
Agora não, ele vai ficar até os 80, 90.
Daí ele fica doente e morre logo.
Acabou a agonia. Pensa bem: a gente está com 50.
Temos mais uns 30 pela frente. Firmes.
É isso, cara: não existe mais a velhice.
E fomos nós que detonamos com ela.

– Mas tem o cabelo branco, as rugas, a barriguinha…..
– Detalhes, cara, detalhes. O cabelo branco, a ruga e a
barriguinha hoje em dia são encarados como charme.
Mesmo porque os cabelos não ficam mais tão brancos como nos nossos
pais.
E as rugas também. Os velhos estão cada vez com menos rugas.
E pra barriguinha, estão aí as academias. Tem fórmulas.

– E isso vale também para as mulheres, né?
– Principalmente. Eu estava falando nas nossas amigas de 40. Pega as
de 50.
Tudo com corpinho de 30. Cabeça de 20. Tão até melhores do que nós,
cara.

– Peraí. a sua namorada não tem nem 30.
– E isso me preocupa. Tem cabeça de 50. De 50 das antigas.
O que serve para a nossa geração, não serve para a nova geração.

Resumindo: não existe velhice para a nossa geração.
A gente batalhou isso. Agora essa nova geração que vem aí vai
envelhecer.
Se ela quiser continuar a ser como a gente,
vai acabar sendo igual aos nossos pais, como diria o grande
Belchior.

– Eu não estou entendendo aonde é que você quer chegar.
– Quero chegar nos 90. Me passa o uísque. Me passa o fumo.
Me passa o viagra. Me passa a saudade que eu tenho dos meus 20 anos.
Me passa a vida a limpo.
E mete os Beatles aí na radiovitrola. Help, please.

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