***Homenagem ao Hugo Chavez***
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Os Palavrões
Os palavrões não nasceram por acaso.
São recursos extremamente válidos e criativos para prover nosso vocabulário de expressões que traduzam com a maior fidelidade nossos mais fortes e genuínos sentimentos.
É o povo fazendo sua língua.
Como o Latim vulgar, será esse Português vulgar que vingará plenamente sem que isto signifique a “vulgarização” do idioma, mas apenas sua maior aproximação com a gente simples das ruas e dos escritórios, seus sentimentos, suas emoções, seu jeito, sua índole.
“Pra caralho”, por exemplo. Qual expressão traduz idéia de maior quantidade do que “pra caralho”?
“Pra caralho” tende ao infinito, é quase uma expressão matemática, física.
A Via Láctea tem estrelas pra caralho, o Sol é quente pra caralho, o universo é antigo pra caralho, eu gosto dela pra caralho, entende?
No gênero “pra caralho”, mas, no caso, expressando a mais absoluta negação, está o famoso e crescentemente utilizado “nem fodendo”! Nem o “não, não e não”!, nem tampouco o nada eficaz e já sem credibilidade “não, absolutamente não”! o substituem.
O “nem fodendo” é irretorquível, liquida o assunto. Te libera, com a consciência e o ego tranqüilos, para outras atividades de maior interesse em sua vida. (…)
Por sua vez, o “porra nenhuma” atendeu tão plenamente as situações onde nosso ego exigia não só a definição de uma negação, mas também o justo escárnio contra descarados blefes, que hoje é totalmente impossível imaginar que possamos viver sem ele em nosso cotidiano profissional.
Como comentar a bravata daquele chefe idiota senão com um “é PHD porra nenhuma!”, ou “ele redigiu aquele relatório sozinho porra nenhuma!”, O “porra nenhuma”, como vocês vêem, nos provê sensações de incrível bem-estar interior. (…)
Há outros palavrões igualmente clássicos. Pense na sonoridade de um “puta-que-pariu”!, ou no seu correlato “puta-que-o-pariu”!, falados assim, cadencialmente, sílaba por sílaba… Diante de uma notícia irritante, qualquer um “puta-que-pariu” dito assim te coloca outra vez em seu eixo.
Seus neurônios têm o devido tempo e clima para se reorganizar e sacar a atitude que lhe permitirá dar um merecido troco, ou se safar de maiores dores de cabeça.
E o que dizer de nosso famoso “vai tomar no cu”!?, e sua maravilhosa e reforçadora derivação “vai tomar no olho do seu cu”! Você já imaginou o bem que alguém faz a si próprio e aos seus quando, passado o limite do suportável, se dirige ao canalha de seu interlocutor e solta: “Chega!
Quer saber mesmo de uma coisa? Vai tomar no olho do seu cu”!
Pronto. Você retomou as rédeas da sua vida, sua auto-estima. Desabotoa a camisa e saia à rua, vento batendo na face, olhar firme, cabeça erguida, um delicioso sorriso de vitória e renovado amor íntimo nos lábios. (…)
O nível de stress de uma pessoa é inversamente proporcional à quantidade de “foda-se”!! que ela fala …
Existe algo mais liberatório do que o conceito do “foda-se”? O “foda-se” aumenta minha auto-estima, me torna uma pessoa melhor. Reorganiza as coisas. Me liberta. “Não quer sair comigo? Então, foda-se!”
“Vai querer decidir essa merda sozinho mesmo? Então, foda-se!”
O direito ao “foda-se” deveria estar assegurado constituição brasileira: liberdade, igualdade, fraternidade e foda-se.
Millôr Fernandes